sábado, 19 de maio de 2018

A natureza me disse - Resenha

ALMEIDA, Maria da Conceição; CENCIG, PaulaVanina. (Org.). SILVA, Francisco Lucas da. A natureza me disse. Natal: Flecha do Tempo, 2007. (GRECOM Grupo de Estudos da Complexidade)

A obra, A Natureza me Disse é fruto do GRECOM – Grupo de Estudos da Complexidade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), que faz parte do Programa de Pós-Graduação em Educação.
A Natureza me Disse, apresenta um conjunto de conhecimentos sistematizados por Francisco Lucas da Silva, ou Chico Lucas, ao longo de sua vida. Resultado de uma série de entrevistas realizadas a partir do contato e convívio com este protagonista onde os autores puderam relatar sua vida e sua relação com a natureza.
Homem do interior do Rio Grande do Norte, que reside na comunidade da Lagoa do Piató no município de Assú. Visto como o homem que ouve a natureza e domador de uma curiosidade extravasada. De início, os autores travam um debate sobre a (i) informação; (ii) conhecimento e (iii) sabedoria.
No decorrer dos escritos, a obra é dividida não por capítulos, mas em conversas – entrevistas feitas com Chico Lucas iniciados por títulos que dá norte a todo o contexto. No primeiro, “Leitura do Lugar”, inicia-se sua narrativa contando como surgiram os povos de sua região. Dos índios que ali vivia e da colonização que ali chegou, formando povos e povos, mestiços, brancos e negros, e ainda tece comentários sobre a alforria dos escravos na cidade de Assú.
Na “Leitura de si e de seu mundo”, Chico Lucas narra como viveu quando criança junto a sua família. Dos lugares onde morou, das pessoas que ali conhecera, da família que construiu. Contorna as coisas que aprendeu a fazer com seu pai, colocando-o no mais alto nível de inteligência, sabedoria e conhecimento das coisas. Com humildade, atribui tudo que aprendera a seu pai e também, por ser uma pessoa, assumidamente, bastante curiosa. É interessante perceber a sua luta pela sobrevivência e o encanto que ele tinha em aprender as coisas. Conta que seu desejo por aprender era tamanho, que seu pai o comprou uma cartilha do ABC; e dos números, relata que aprendeu vendo seu pai no comércio que também o ensinou.
Dotado do conhecimento básico das letras e números, Chico Lucas é “Doutor” em muitas artes e tantas singularidades que é só dele. Conhecedor da pesca, da agricultura, da construção de canoas e barcos a motor; entendedor da medicina natural, ecologia, cosmologia, arqueologia, e tantas outras razões de intelecto.
Noutro vértice, há também a “Leitura da vegetação” por Chico Lucas, aqui ele demonstra os tipos de vegetação existentes em sua região – fala de cada uma delas com a intimidade de um biólogo. Na “Leitura da fauna” narra os tipos de animais e o relacionamento destes com a natureza, relatando fatos corriqueiros do dia a dia. Na “Leitura de fenômenos físicos”, explica como estes fenômenos reagem para ele e como ele os explica.
A “Leitura da farmácia da natureza” trata-se de um relato, por Chico Lucas, dos benefícios de medicamentos ou receitas naturais para variadas questões de saúde – o que ele mesmo aprendeu observando ou mesmo com seus pais. E por fim, na “Leitura da pesca”, Chico Lucas como bom pescador e conhecedor dos peixes, narra o seu modo de pescar e os variados tipos de peixes presentes na Lagoa do Piató.
Consigne-se a relação de Chico Lucas com a Natureza – uma relação íntima que leva a importância que ela tem para ele; o respeito e seu sentimento quanto àqueles que não a respeitam. Desde criança, foi um grande expectador na observação e reações da natureza, e, de seus limites também. Declara que “é preciso saber ler a natureza, além de a observá-la.”
Chico Lucas deixa claro em sua fala seu sentimento quanto à destruição do homem com a natureza. A devastação da terra, as queimadas, a poluição da lagoa, afetando diretamente os peixes.
Voltando aos conceitos do início da obra, os autores conseguem capturá-los na conversação com Chico Lucas, dotando-o como aquele que tem informação e sabe usá-la, que sabe manipular, enxergar e observar. Interpretando, inserindo num campo maior e acompanhando as transformações e ao mesmo tempo em constante diálogo; aquele que tem conhecimento o bastante de tantas e tantas coisas por se apresentar como um ser que é curioso e que sempre fora aberto a conhecer e aprender; e por fim, coroando-o com a sabedoria – intelectual da tradição, artista do pensamento o que não se reduz a um conjunto de conhecimentos. Este último se transforma diferente do primeiro, a sabedoria, esta permanece porque se torna essencial e duradoura O conhecimento se transforma, porém a sabedoria fica porque fala do essencial e inabalável. 

Psicologia Social




Elisângela Feitosa de Souza[1]

Breves Considerações

A Psicologia Social é um ramo da psicologia que procura estabelecer uma ponte entre a psicologia e as ciências sociais, dentre as quais podemos destacar não apenas a sociologia, mas também a antropologia, a história e, inclusive, a ciência política. Dentre os postulados da Psicologia Social que interessam de modo mais específico a ciência política está a ideia de que fora das motivações psicológicas, não é possível ter uma compreensão satisfatória dos fatos sociais e, por concomitantemente, do processo político. O que está na base dos fenômenos políticos, para a Psicologia Social, é que os fundamentos do poder e da obediência são de natureza psicológica.
A Psicologia Social se interessa, como a Sociologia ou a Antropologia, pelo do comportamento social dos indivíduos, mas dando ênfase aos processos sócio-cognitivos que possam explicar tais comportamentos. Enquanto ciência empírica utiliza métodos diversificados de pesquisa para o estudo sistemático do comportamento social humano: de como os pensamentos, sentimentos e comportamentos das pessoas são influenciados pela presença – concreta ou imaginada – de outros indivíduos. A Psicologia Social se interessa por temas como o preconceito, a violência, processos de grupo, entre outros.
A Psicologia Social enxerga o individual de modo mais amplo e se interessa por entender como as forças sociais atuam sobre os indivíduos e vice-versa. E por isso interessa também à ciência política, no sentido de que aquilo que é vivido no campo individual contribui de alguma forma para a melhora ou piora da sociedade, para a manutenção ou quebra de paradigmas, implica nas motivações pessoais de luta pelo poder dominante.
E é a esta relação que se dedica principalmente esta seção: compreender quais motivações psicológicas podem influenciar não apenas as relações pessoais, mas sociais e políticas, entendendo o ser humano como um ser eminentemente social e político.


O ser humano isolado do contexto social

 Na perspectiva de estar envolvido na sociedade e nesta manter relações e contribuir para com seu desenvolvimento, o homem é eminentemente um ser social e que, portanto, desta é dependente.
 Não seria necessário atribuir vantagens e desvantagens de como a sociedade e o papel desta, é importante no processo de formação do homem. Este ser que desde o berço recebe influência, e no decorrer de sua vida, outrossim, parece deixar-se moldar por ela. Porém pode o homem viver fora dela? Perdido em uma floresta, ou em uma ilha, passando a conviver com outros seres, ou ainda retirado dela por imposição de outro?
 Obras como “O menino selvagem”, “Ensaio sobre a cegueira”, e “Náufrago”, são exemplos de como fatos como estes são vivenciados – mostrando de fato o que a ausência do coletivo, da interação – enfim, da sociedade causa nas pessoas.
 O papel da civilização está inteiramente ligado à formação da personalidade do homem; e quando esta não está inserida nele, o que o influenciará? O menino selvagem conta a história de um adolescente que, privado de educação por ter vivido afastado dos indivíduos da sua espécie, é encontrado em uma floresta vivendo em condições desumanas, pois este já não tinha hábitos humanos, andava com os pés e as mãos no chão, subia em árvores, comia raízes. Quando o menino selvagem é retirado da floresta, é feito com ele um processo de socialização – pois este atribuíra a sua personalidade, agentes biológicos e físicos do meio ao qual estava inserido. De início, não iria ser fácil socializá-lo, agora com quase 13 anos, o menino selvagem teve de passar por vários testes, a fim de aprender, embora lentamente, a falar, a andar, comer com colher, usar roupas, etc. Graças à educação e a cultura atribuída ou imposta ao menino selvagem – Victor fora aculturado e aos poucos se tomando por hábitos humanos.
O Náufrago retrata a vida de um homem contemporâneo em que seu cotidiano é corrido, pois traba lha demasiadamente, assim tem pouco tempo para a família e assuntos sentimentais. Vive em uma ilha por quatro anos, após um acidente de avião, ele fora o único sobrevivente. O personagem carrega com ele todos esses anos, uma fotografia de sua esposa e uma bola de vôlei, a qual dá o nome de Wilson. O personagem tenta adaptar-se aquele ambiente, o qual desconhece, no entanto, tenta desvendar todos os modos de sobreviver àquilo. Desde o fazer do fogo para aquecer-se, a glória de conseguir pegar um peixe, e até mesmo suportar as dores humanas naturais ou não. Como agiam nossos ancestrais, ele descobre a caverna e lá fez seu lar; de um modo surpreendente, não se deixa perder seus instintos e inteligência, passa a escrever e marcar nas pedras todos os meses que ali estivera; quanto ao isolamento, fez de uma bola sua companhia – sentia a necessidade de comunicação, e nela com seu próprio sangue pintou a face de um novo amigo. Após ser encontrado e resgatado, volta para o seu meio social de outrora. Ali, diferente da obra “O menino selvagem”, não houve conflito em sua volta a sociedade, já era adulto quando esteve sozinho, resta uma readaptação ao convívio social.
O ensaio sobre a cegueira, filme baseado na obra do escritor português, José Saramago, conta a trama de uma cidade que é acometida por uma epidemia sem nome, uma cegueira branca contagiosa. No decorrer da história toda a sociedade vai se dissolvendo, assim como os valores, a dignidade humana, os princípios morais – é percebível quando tais pessoas contagiadas são colocadas isoladas de tudo e de todos, em um local indigno de se viver. Todos ali são postos sem cuidados e sem previsão para pesquisar a cura. As pessoas ali voltam ao estágio inicial de suas vidas, onde terá que aprender a viver de outra maneira, adaptando-se a falta da visão, neste sentido é deixado de lado o individualismo, percebendo que diferente será o caminho que terão de seguir, na descoberta dolorosa do eu e do outro, do coletivismo.
Diante destas obras, e de sua relação com a Psicologia Social, é notável que o homem detém toda a história e o poder sobre as sociedades e de suas relações, influências ou contribuições, sejam estas boas ou não. Há quem diga e defenda que a sociedade molda o homem e que dela este depende. Mas até que ponto precisou dela, e por que nela não somos e agimos como iguais ou ainda, coletivos? Por que há o individualismo? Será preciso isolar-se da sociedade para reconhecer-se que precisamos um do outro, reconhecer a essência que há nisso tudo? Os valores morais estão sendo perdidos, o dedicar-se ao eu interior, a observação dos comportamentos próprios, o importar-se com a dignidade e o respeito pelo outro, são marcas que não devem ser deixadas, esquecidas ou ameaçadas.


Referências Bibliográficas

SARAMAGO, José. Ensaio sobre a cegueira. Brasil, 2008.
TRUFFU, François. O menino selvagem. França, 1798.
ZEMECKIS, Obert. Náufrago. EUA, 2008.



[1] Assistente Social. Pós-graduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional.

Bullying: vítimas de dois lados?

    Assunto que passa a conotar uma nova denominação e maior foco nos últimos anos, a violência – forma de agressão que se amplia quando discutido partindo-se da ênfase escolar. Partimos do conceito do termo, “violência” do dicionário Priberan on-line (2012)[1]: s. f. 1. Estado daquilo que é violento. 2. Ato violento. 3. Ato de violentar. 4. Veemência. 5. Irascibilidade. 6. Abuso da força. 7. Tirania; opressão. 8. Jur. Constrangimento exercido sobre alguma pessoa para obrigá-la a fazer um ato qualquer; coação. Basta encaramos tais definições e percebemos que a violência existe e se amplia, fortificando-se cada vez mais nas sociedades. Convergindo com novas definições, ou especificidades, quando ao tratarmos do fenômeno mais recente, o bullying. Este que está presente nas famílias, no trabalho, nas ruas e principalmente na escola. “De acordo com dados obtidos em trabalhos internacionais, não existe escola sem bullying. O objetivo é alterar a forma de avaliação do que é brincadeira e do que é bullying, mudando o enfoque da questão para a valorização do sentimento de quem sofre o bullying, isto é, respeitando seu sofrimento e buscando soluções que amenizem ou interrompam isso”, diz o coordenador da Abrapia[2]; os dados coletados revelaram que 40,5% dos alunos entrevistados disseram estar envolvidos em episódios de violência[3].
O bullying significa “valentão”, ou autor das agressões. Caracteriza-se por agressões repetitivas, sejam estas verbais ou físicas feitas por uma ou mais pessoas, contra uma ou mais pessoas. Os agressores normalmente aparentam serem superiores, quanto à estatura, idade, força física ou emocional, etc. Não obstante, o agredido, são pessoas pouco sociáveis, com baixa capacidade de reação e inseguras o que os impedem de pedir ajudar.
Seria mesmo a necessidade de se impor sobre o outro o grande fator para tal ato? Os dados estatísticos em relação à violência escolar mostram-se em grandes dimensões entre crianças e adolescentes. Dados preocupantes quando legendados e justificados com aspas aos agressores, julgando-os como vilões. Enquanto, na verdade atos destas dimensões são acarretados, por exemplo, por uma história familiar de violência, abandono e/ou rejeição.
Muitas vezes a criança não tem a atenção da família, ou ainda são violentados por estes; como também a ausência da tríade entre a família – escola – criança/adolescente; salientando ainda os princípios básicos de valores morais, o respeito ao outro, a empatia estão sendo esquecidos no convívio familiar. Por outro lado, a criança ou é agressiva ou ainda pode sentir-se indiferente aos outros, o que pode acarretar comportamentos ofensivos ou de isolamento, respectivamente.
Quanto aos atos praticados, a criança/adolescente afetada será densamente prejudicada, seus afetos, comportamentos e aprendizagem principalmente, sua formação enquanto adulto poderá tornar-se imprópria no que tange a o emocional deste. Variantes ideias de não a empatia poderão formar-se em seu dia a dia tornando-se uma criança/adolescente e adulto insensível às diferenças dos outros.
Relativo a isto, vale destacarmos o papel do educador e da instituição no ambiente escolar. De fato, muitos são os argumentos quanto ao comportamento dos agressores, quando indicados que tais ações devem ser tratadas em casa, com a família – mas é na escola onde é mais frequente. Claro que a culpa não esta na segunda. Porém, o que falta é a tríade entrar em ação, a união destes papéis; haverá interação entre estes quando os pais, bem como a escola estiverem a par do que acontece com cada criança/adolescente em particular. Portanto, seu desenvolvimento, aprendizagem e amadurecimento, serão eficazes diante disto.
Atualmente, o bullying se configura como crime, pois fere os princípios constitucionais de respeito à dignidade humana. Em algumas regiões do Brasil, há programas de prevenção e combate ao bullying. No Paraná, por exemplo, foi aprovado o Programa de Combate ao Bullying, de ação interdisciplinar e de participação comunitária, nas suas escolas públicas e privadas5.
Valendo-se desta Constituição, há que se destacarem também algumas garantias essenciais em relação à criança:

Art. 227, CF: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Diante deste fenômeno, cabe as instituições de ensino, junto as famílias realizarem projetos intensivos com as crianças/adolescentes. Realizarem campanhas juntos, levando-os a sensibilização do quão grave e séria é esta forma de violência, compreendendo suas consequências no hoje e no amanhã, caso permaneça existindo em seu meio. Confecções de cartazes, ou concursos de redação sobre o tema, passeatas pela comunidade, construção de blogs pelos estudantes, onde estes possam desenvolver campanhas online.



[1] Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.
[2] ABRAPIA Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência.
3 Pesquisa realizada em 1997 no Brasil.